sábado, 31 de outubro de 2009

... não desiste nunca

A Polícia Federal montou operação neste feriado pra tentar diminuir o grande número de mortes em nossas estradas.

O nome da operação: Finados.

Isso é que é otimismo!

RIP
no feriado

terça-feira, 27 de outubro de 2009

Ressurgirá das cinzas

Como testemunhei no meu outro blog há quase um ano, quando estava nos EUA, o duplo mote da cidade de Detroit é, em Latim, esperamos dias melhores e ressurgirá das cinzas. As frases não se referem à presente conjuntura de Motown, que continua digna de sua bandeira, mas a um passado distante, quando um incêndio, daqueles de botar inveja no insano Nero, arrasou com a cidade.

Mas estou aqui pra falar do Rio, que pode fazer das de Detroit suas próprias esperanças. Outro dia vimos o confronto entre polícia e traficantes ceifar a vida de dois PMs que sobrevoavam uma favela no complexo do Alemão. Do alto de suas citadelas fortificadas, os bandidos alvejaram um helicóptero levando três homens, que logo pegou fogo e iniciou queda livre. Heroicamente, o piloto conseguiu pousar a máquina em chamas e salvar-se, mas seus dois companheiros não tiveram a mesma sorte. O nome da nave: Fênix II. Dramaticamente irônico esse episódio, pois essa falecida ave da crua realidade brasileira nada tem em comum com a mitológica: não ressurgirá de suas cinzas jamais. No máximo, algumas partes em bom estado serão guardadas prum futuro transplante. Me pergunto se a Fênix I ainda bate asas.

Enquanto brinco inutilmente com as palavras, nosso governo se gaba de trazer Copa do Mundo e Olimpíadas pruma cidade em pleno estado de guerra, guerra que o governo não está ganhando. Que ousadia inconsequente a desses barbados! E enquanto isso em BH a tão prometida expansão do metrô já foi "desprometida," pelo menos por agora, pra finalidades eleitoreiras, como tem sido. Isso deve nos dar uma boa idéia do grau de comprometimento dos nossos políticos pra conosco e com os compromissos que fazem.

É como disse um certo romano, O tempora, o mores!


segunda-feira, 26 de outubro de 2009

Abaixo as palmeiras

Se há algo que me irrita profundamente em termos de arquitetura e paisagismo, ainda que eu não passe dum leigo no assunto, é como empregam-se palmeiras onde elas não fazem sentido. Canteiros, fachadas, ou até mesmo no campo, elas destoam do resto da paisagem na maioria dos locais em que são postas. Não consigo ver a relação estética delas com o resto dos ambientes.

Consideremos, por exemplo, o Grande Hotel de Araxá:



quem, ao ver esta foto sem saber do que se trata, pensará que esta pérola se encontra nas nossas "queridas Minas Gerais?" Reparem como, de um complexo condizente com seu contexto mineiro interiorano, o Grande Hotel ganha ares de resort de praia. O Grande Hotel segue o chamado estilo missões, inspirado na arquitetura espanhola no México e na Califórnia. Tem mármores esplêndidos, mobília francesa, lustres e cristais alemães. Em outras palavras, é clássico. E não está na costa, como os edifícios dos nossos hermanos do norte, mas sim encravado a mil quilômetros dela, no limiar do Planalto Central. Nada a ver com palmeiras. Um crime à dignidade do prédio.

Lugar de palmeira é na praia, à beira-mar, com uma rede amarrada entre duas delas pra se deitar displicentemente e ver o vai-e-vem das ondas ao pôr-do-sol. E, dadas as atuais circunstâncias do Campeonato Brasileiro, devo mudar o artigo definido e dizer, também, abaixo o Palmeiras. O Galo vai dar um jeito nisso logo, logo. Mas quem vai dar um jeito nelas?

sábado, 24 de outubro de 2009

Certo ou errado?

O Programa Cidade Limpa, da prefeitura de São Paulo, parece estar se esmerando pra manter a metrópole arrumadinha. Os outdoors irregulares foram banidos com mão de ferro. O próximo passo, aparentemente, são os mendigos. O paulistano agradece, mas nem tanto essa população despossuída que habita nossas ruas. De propósito ou não, as medidas do programa estão encurralando os mendigos, privando-os de seus limitados recursos. Bancos de praças foram dividos em lugares individuais com barras, de modo que ninguem consegue deitar neles. Grades foram postas em frente às escadarias das igrejas pra que ninguem durma nelas. As calçadas são lavadas todas as noites, de modo que deitar nelas se torna um perigo, pelo frio que faz na noite paulistana. Ao amanhecer, as mesmas equipes passam recolhendo colchões, cobertores, folhas de papelão, roupas, calçados e tudo mais que encontrarem. São Paulo tem 15.000 moradores de rua e 9.000 vagas nos albergues.

É uma sacanagem(?). Todo cidadão tem o direito de usufruir de cidades limpas e sem perigo de assaltos, mas o mendigo também é um cidadão com direitos básicos garantidos por lei, que o estado falha em garantir. Se a limpeza urbana passasse e carregasse pertences nossos, ficaríamos justamente ultrajados. Então, quem dá à prefeitura o direito de carregar os parcos pertences dos sem casa? É um tratamento covarde e que beira o desumano. O buraco é mais embaixo, a população não deveria estar omissa a isso.

sexta-feira, 23 de outubro de 2009

Por que o seu filho deve ser um metaleiro

Se, como eu, você está num relacionamento sério, leitor do sexo masculino, você sabe que pegar-se falando de casamento e filhos é uma temeridade normal, da qual não tem como fugir. Ossos do ofício. Foi numa dessas ocasiões, em que discutia como melhor criar filhos, que cheguei à conclusão - após uma árdua arguição pela minha namorada - que, quando o assunto é gosto musical e atitudes adjacentes, o melhor para os pais é que seus filhos sejam metaleiros. Já explico.

De modo geral, digamos que o heavy metal constrói caráter. Talvez não seja o ideal, que seria o seu filho ser um amante da música erudita, mas serve bem em vista do que há por aí. Pra começar, menciono a grande quantidade de moleques - e molecas - que decidem aprender um instrumento inspirados por seus ídolos musicais. Pra estar abilitado a tocar esse gênero há que dedicar-se muito, pois o rock em geral está cheio de grandes virtuoses, cujo passado pregresso inclui oito horas diárias de estudo trancafiados no quarto (que isso redima o resto). A molecada se organiza em bandas e aprende a trabalhar em grupo, dando voz a sua sensibilidade. No meio do caminho, muita vezes surge um interesse gradual por outros gêneros musicais mais conceituados, como o MPB, o clássico e o jazz, o que enriquece a experiência musical dos meninos.

O gosto pela música em si trará benefícios ao comportamento do seu filho. Fã de heavy metal (e rock em geral) vai a show pra ouvir a banda tocar - e, por que não, fazer uma modesta tietagem. Ao contrário do que muita gente pensa, shows de metal são organizados, o público é em sua grande maioria pacífico, não rouba, não arruma briga e prestigia as bandas. Elas adoram o Brasil. Ninguém está ali pra beijar 25, dar amassos, transar e engravidar atrás do trio elétrico, ao contrário da turminha de abadá. Vê-se o show, depois comenta-se com entusiasmo sobre a performace da banda, a estrutura da casa, o equipamento e o repertório; come-se um dogão e ruma-se pra casa. Prejuízo: uma minúscula perda de audição que se manifesta por um zumbido que durará até a manhã seguinte. Mais nada.

Engana-se também quem pensa que todo roqueiro é pé-de-cana e dependente químico. Claro que há muitos beberrões no meio, assim como há em qualquer lugar. Mas não há nada no metal que crie uma ligação com álcool. Eu mesmo cresci com meus amigos ao som de power chords e tappings bebendo a boa e velha Coca. Mais de uma vez já vi moleques metaleiros, inconfundíveis em seus trajes pretos, coturnos militares e cabelos compridos e disciplinados, em pé na porta do supermercado comendo biscoito recheado e tomando iogurte. Idílico. Não são mais do que moleques em busca de uma identidade, um senso de grupo, algo que lhes faça crer estar envolvidos numa boa causa, só isso. E pra matar a fome na rua nada melhor que biscoito e iogurte. Sacou?

Meu último argumento de que metaleiros são pessoas muito melhor influenciadas e comportadas do que a galera mainstream do pagode, funk etc. é que o metal explora o reino da mais pura fantasia. Quantas são as bandas que flertam com mitologia, folclore, estórias de reinos distantes, cavaleiros valorosos, princesas "fremosas" e batalhas ao por-do-sol? Pensem em Blind Guardian, Thuata De Dannan e Rhapsody, por exemplo - nada contra elas. Quão ingênuo e inofensivo é o adolescente que viaja na onda de caras de naipe assim?


Combatendo o mal
Preciso dizer mais? Quanto àqueles que acham que metal é coisa do diabo, Ozzy Osbourne é um bufão, coisa do diabo é 5 mil pessoas ensandecidas atrás do trio elétrico, bêbadas, vomitadas, semi-nuas e esfregando-se uma na outra num frenesi incontrolável.
Preciso dizer mais?
Por isso, senhoras de senhores, pais e mães do Brasil, atualmente e por tornar-se, estimulem seus filhos a encher o silêncio sagrado do lar cristão com heavy metal. Os benefícios serão pra vida toda. Seu filho ou filha vai crescer um adolescente tranquilo, adquirirá um gosto por músicas de qualidade e outras artes, não se meterá com más companhias e ficará longe de encrencas. Uma adolescência perfeita, uma passagem perfeita para a vida adulta pacata e bem sucedida. E se forem legal com eles, eles virão visitar com frequência, anotem o que estou dizendo.

E viva o rock!


segunda-feira, 19 de outubro de 2009

Entre os muros da Escola - dentro e fora




Quem quiser refletir sobre esse ótimo filme Laurent Cantet deve, em minha opinião, começar pelo título, cuja imparcialidade está aberta a várias possbilidades: uma crítica, um alerta, um grito de socorro, todos são plausíveis. Dada a complexidade do assunto, penso eu que o que Entre os Muros faz é nos dar uma visão neutra do processo de educação com enfoque no ambiente escolar e pouca interferência do que há de fora.

É claro que não podemos ignorar o que se passa fora da escola pra entender o resultado do esforço de guerra que é formar cidadãos. Não obstante, é muito importante sabermos que métodos norteam o funcionamento das coisas dentro dela. Se há qualquer crítica à escola em Entre os Muros, é porque ela inevitável, uma vez que são focados a sala de aula, o papel do professor, o comportamento dos alunos, a participação de pais, entre outros. O problema é complicado demais pra se acusar apenas um lado. A escola é o local crítico de todos os fundamentos e práticas de nossa civilização. Não o inicial nem o mais importante, pais! É nela que as pessoas devem aprender a entender o porquê de tudo ser como é, o motivo de haver leis, a necessidade de autoridade e disciplina e a importância do conhecimento. Mas a escola não pode simplesmente se valer de seu poder para impor esses fundamentos e doutrinar mentes com os valores que tem por missão transmitir. A escola deve ter a boa vontade para dialogar e não pressupor que os estudantes já entendem claramente porque estão lá. Apesar disso, é muito difícil corresponder às expectativas, pois pessoas em idade estudantil geralmente carecem de maturidade o bastante para entender por que precisam ir para a escola. Muitos chegam lá com idéias tortas do papel dessa instituição. Muitos não se importam, acham que ela não fará diferença em suas vidas sem sequer lhe dar uma chance. De modo geral, há uma boa dose de resistência à cooperacão em ambas as partes.

Voltando ao filme, há aspectos dignos de nota. A interação do corpo docente é bem desenvolvida. A atuação dos adolescentes é muito boa. O fato interessantíssimo é que os professores no filme são de fato professores na vida real, o que facilita a encarnação no papel e acrescenta um tom de documentário à produção. As cenas em sala são fidedignas, deve ter sido muito difícil fazê-las parecer naturais apesar da manobra inusitada de Cantet. O professor François é o retrato do professor atual, que se vê no dever de lutar pra preservar sua autoridade em meio à algazarra e à indiferença ao seu conteúdo. O enfoque no professor de língua francesa não foi por acaso, pois dominar o vernáculo é a competência mais importante de todas: é o pré-requisito para as outras matérias e pra tudo mais na vida. E como ensinar a língua materna se todos já a falam fluentemente? Primeiro, e mais importante, ensinando os alunos a ler e escrever com abilidade crítica. Segundo, ensinando a variedade de língua que nenhum de nós fala no dia-a-dia, o registro formal, ou norma culta. Não a falamos não porque somos burros, mas porque a norma culta é uma convenção nada realista, um pedaço morto e congelado de língua necessário para que haja regularidade sobre todo o território onde um idioma é falado. Os desafios são enormes.

Entre os Muros se poupa os trabalhos de apresentar uma linha crítica aberta e de propor soluções ao problema da escola. Apenas tenta mostrar a escola como ela é, propondo, sim, que os desafios que ela enfrenta são semelhantes em qualquer lugar (em nosso país eles chegam a níveis gritantes). Todos já foram alunos, por isso são capazes de contribuir com o debate. Assistam e pensem.

sexta-feira, 16 de outubro de 2009

A opulência dos trópicos e dos nórdicos

Em Belo Horizonte, um caminhão carregando quatro vezes mais gado do que deveria é preso após acidente. Como a carga não tivesse licença do Ministério da Saúde, dezenas de bois foram sacrificados. Em Estocolmo, uma espécie não-nativa de coelho é tão bem adaptada que se tornou, por assim dizer, uma praga. Como causam incoveniências ao erário, sujando parques e ameaçando a fauna e flora locais, a prefeitura da capital sueca permite que milhares desses bichos sejam caçados todos os anos. Em 2008 foram 6 mil. O destino final de tantos coelhinhos mortos: o alto forno.

Se você pensou que os suecos estão comendo churrasco de coelho em escala industrial, sua ingenuidade prova que você é um brasileiro acostumado ao sol, à cerveja gelada e à picanha na brasa. No frio das terras nórdicas as necessidades são mais elementares: os coelhos geram energia para esquentar lares suecos. Seus corpos são congelados até atingirem um número alto, depois são esmagados, triturados e levados ao fogo com restos de lixo, pixe e o que mais houver. Sustentabilidade ambiental e algumas famílias aquecidas inverno adentro.

Um holocausto diário? Pense à vontade, pois são ambos problemas extremamente complexos. Enterrar toneladas de lixo no solo, às vezes perto de cursos d`água, me parece até um problema mais sério, mas nos dois casos acima estamos falando de vidas dizimadas com pouca ou nenhuma consideração. O que me assusta é como podemos estar tão confortáveis perante situações assim. Na Suécia, a reação ao uso dos coelhos foi chamada "moderada." Aqui no Brasil, todos sabemos que há muitos fornecedores irregulares de carne abastecendo o mercado com produtos desprovidos de higiene e dignidade, e no entanto a grande maioria de nós sequer se lembra da palavra procedência quando vai às compras. Como diria Hamlet, se tivesse tido a chance de parar por aqui, há mais entre o abatedouro e aquele espetinho do que sonha nossa vã filosofia.

A crueldade com que a vida tem sido tratada é, em grande parte, a forma desumanizadora com que o capitalismo lida com as coisas, à medida que a procura por um produto e a perspectiva de lucro atingem níveis gigantescos. Acontece que não podemos simplesmente culpar o sistema como se estivéssemos fora dele. Nós, também, somos agentes dele e precisamos reavaliar nosso papel. Sei que é difícil, mas precisamos pelo menos refletir se quisermos de fato buscar soluções. Não podemos apenas cobrar de nossos políticos. Temos que nos compremeter e contribuir para melhorar esse mundo fodido.