sexta-feira, 20 de novembro de 2009

Monumentos do empreendedorismo humano

Dicionários são como catedrais, até mesmo superiores: demoram décadas pra ficar prontos, mas uma vez prontos duram séculos. A única diferença, talvez, é que, ao contrário da religião, as línguas mudam, portanto dicionários precisam de constante atualização. Mas a arquitetura que lhes dá vida nunca perderá sua gradiosidade. Aqui vai uma pequena homenagem a esses gigantes.

1. Woordenboek der Nederlandsche Taal



Esse gigante Grande Dicionário da Língua Holandesa é o maior do mundo. Está em construção há mais de 150 anos, registra vocábulos do séc.16 e já se aproxima dos 43 volumes e 50 mil páginas. É mole?

2. Oxford English Dictionary



A maior, ainda que não única, autoridade em inglês. A empreitada de montá-lo começou entre um círculo de homens de letras insatisfeitos com os dicionários existentes em 1857. O primeiro fascículo saiu em 1884. Hoje, serve de base pros outros que vieram depois e não há esse estudante que viva sem um.


3. K'ang Hsi



O ancestral dicionário da língua chinesa registra impressionantes 47 mil ideogramas (!) sendo que hoje não se precisam de mais do que um quarto disso pra se viver na China. Publicado em 1716, de pé até hoje, é uma maravilha do Oriente.

4. Diccionario de la lengua española de la Real Academia Española



O dicionário dos nossos irmãos de idioma foi fundado em 1780. Segue fuerte em sua 23a edição. Salud!

5. Deutsches Wörterbuch



Foram os famosos irmãos Grimm, notáveis filólogos que eram, que iniciaram a feitura do grande livro de palavras alemão. Duas guerras mundias e um muro depois, o projeto foi finalizado em 1961. O dicionário contem nada menos que 350 mil verbetes. Wunderbach!

6. Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa



Embora pra maioria de nós o pai-dos-burros atenda por Aurélio, o maior e mais estupendo dicionário já composto para a grande língua portuguesa tem um nome complicado de libanês (mas imaginem se fosse Antonio!). Começado em 1985 e terminado dezesseis anos depois, esse gigante "traz cerca de 228.500 verbetes, 376.500 acepções, 415.500 sinônimos, 26.400 antônimos e 57.000 palavras arcaicas" (Wikipedia). Suas páginas são quase transparentes de tão finas, mas ao todo é uma obra sólida e dificilmente alguma outra no mundo lusofalante vai ultrapassá-la nos próximos séculos. Bravo, Sr. Houaiss.

Dicionários, estruturas dignas de um programa da NatGeo. Corajosos os caras que se lançaram à tarefa de fazê-los, merecem estátuas em praça pública, são ídolos da pátria. Respeite os dicionários - e aprenda infinitamente com eles.


"Dilmoplacia" petista

O caso Cesare Battisti pode até ser complexo, mas não creio que vale e pena sacrificar boas relações com um país amigo pra salvar o pescoço de um malandro só. O PT fica querendo livrar caras com "passado de lutas" (diga-se terroristas) como parte de sua agenda ideológica e já bate cabeça ridiculamente, desafiando a justiça italiana e a nossa.

Pra mim, leigo que eu sou, a coisa é razoavelmente simples: se a justiça italiana condenou Battisti, então não cabe ao governo brasileiro discordar. Seria como dizer que eles estão errados. Uma descortesia do tipo você chegar pro seu vizinho e dizer, na lata, "Não vou te emprestar minha furadeira porque você vai acabar estragando-a." Pode até ser verdade, mas não se faz isso.

Dizer que vão segurar o Battisti por uma questão de direitos humanos, que os italianos querem se vingar dele, é uma ofensa grave, ainda mais quando se trata de uma nação democrática. Se não erro, foi concedido asilo a dois atletas cubanos que desertaram durante os Panamericanos. Ali sim era o caso se preocupar com direitos humanos, pois o Fidelzão ia ficar macho com eles.

Só pra fechar, imaginemos que o infame Salvatore Cacciola tivesse se escondido na Itália e o Brasil doido pra por as mãos nele: os italianos teriam por que entregá-lo? Como diz o Sargento Rocha do Tropa de Elite, "quem quer rir tem que fazer rir, pô!" Quer cara mais diplomático que ele?
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PS: pra conhecer o outro lado da política externa nacional, leia quem realmente entende do assunto.

quinta-feira, 19 de novembro de 2009

Inventando a roda com Acir Antão

Sei que ouvir a "rádio de Minas" é meio que um clichê, assinalando muitas vezes o sujeito que nem sequer conhece as outras emissoras do Estado. Mas enquanto se prepara aulas qualquer passatempo serve.

Não sei, porém, pra que serve o programa do veteraníssimo Acir Antão - dono duma voz extraordinária -, que vai ao ar de segunda a sábado das 9 às 10. Acho que só mesmo pra passar o tempo, passar o horóscopo do dia (indispensável!) e ariar o brio da "dona-de-casa-amiga-e-companheira-de-todas-as-manhãs." Sem falar que o cara faz o social dele todo ali, hahaha! Deve ser por isso que ele tem liberdade pra falar de quase tudo e numa dessas soltou uma pérola sobre as políticas conjuntas das irmãs em miséria Contagem e Betim.

Segundo Antão, as prefeitas Marília Campos e Maria do Carmo Lara estão "inventando a roda" ao planejar interligar seus domínios por meio da velha estrada de ferro que passa por eles, implantando sobre ela o revolucionário (anote bem!) VLST, Veículo Leve Sobre Trilhos - em outras palavras, Metrô.

O troça do Antão faz sentido porque, afinal, há muito tempo havia de fato um trem naquela linha ligando municípios da Grande BH, numa distante época em que a capital era conectada por uma malha ferroviária razoável, com bondes indo da Pampulha até a Gameleira e trens levando plus ultra, uma geografia completamente diferente da atual. A cidade cresceu desordanadamente e o transporte sobre trilhos virou caminho de minhoca. Agora, algum funcionário a Prefeitura de Contagem deve ter informado a prefeita que tem uma linha de trem na cidade e ela pensou, "Pá! Como não pensei nisso antes? Me ponham na linha com a Maria do Carmo agora! Vamos fazer um trem!" E far-se-á o trem. Espera-se.

Agora, VLST é na verdade diferente de metrô, pois é um tipo de trem muito mais leve e tecnológico. Portanto, falar que vão pôr um desses na cidade é outra coisa. Qual é que vai ser?

O Acir Antão deve ter algo contra a nossa convalida Contagem ou então só está fazendo seu papel de prestador de serviços. Ao comentar sobre os 218 anos da banda de música de Sabará, além do fato de Mariana ter não sei quantas, o radialista soltou, "Agora, me fala quantas bandas de música tem Contagem? Pra mim Contagem tem 1 milhão de habitantes e não tem nem uma rodoviária." Se ele tem certeza que não há uma sequer banda de música em Contagem eu não sei, mas sei que temos um grupo jovem de música erudita que já inclusive se apresentou no exterior. Isso ele não deve saber. Mas, enfim, não temos uma rodoviária, não temos um teatro decente, não temos um hospital de ponta, não temos um aeroporto (muito menos!), não temos uma biblioteca abrangente, não temos um estádio razoável, nosso time de futebol só foi fundado em 2006. Não temos IPTU. Quem sabe quando de fato chegarmos ao 1 milhão...

Quem sabe sobra uma rebarba da verba da Copa pra fazer um puxadinho até nós?

Bloody French Bastards!!!

Demonstro aqui minha simpatia pra com a seleção irlandesa de futebol, que foi garfada no jogo contra a França pelas Eliminatórias 2010. Foi feio.

Pobres irlandeses, são uns underdogs da bola, custando pra aprender a jogar e vencer o trauma de praticar um "esporte inglês," e ainda por cima aprontam uma dessa com eles?! Assim eles só vão querer saber de futebol gaélico ou hurling, que ninguém tem a menor idéia do que sejam!

Joyce ficaria furioso com isso.


Better luck next time, lads.

segunda-feira, 16 de novembro de 2009

Por que eu esqueci o 15 de novembro

Ontem olhei o calendário várias vezes consecutivas, fixamente, neste mesmo local, e em momento nenhum atinei pro fato de que era um dos feriados nacionais mais importantes. De quem é a culpa por eu ter esquecido a Proclamação da República?

Tirando a velha desculpa de estar ocupado e tal, que às vezes é legítima!, imagino que há outros fatores envolvidos. Creio que trata-se dum caso de cidadania pouco desenvolvida dos brasileiros, que pouco se importam com os feriados nacionais, entre outras instâncias de patriotismo e cidadania. Algo que vem lá de cima e de baixo, também. Algo, portanto, que precisa ser dialogado amplamente. Na minha opinião o país não incentiva o sentimento cívico como deveria, assim a população, já ceticizada pela podreira de nossa política, não consegue distinguir entre a entidade país e os políticos que ocupam cargos temporários. Triste.

Se temos feriados nacionais, é necessário celebrá-los oficialmente; não como se todos devessem ir às ruas pra cantar e ouvir discursos pomposos, mas algo que mostre que a data é mais do que uma simples data. Alguns feriados são de fato celebrados, como a Independência. Outros, como Tiradentes, passam batidos vergonhosamente.

É necessário começar essa educação da juventude pra cima. Uma vez discuti o tema com alguns alunos e a maioria mostrou-se indiferente. Eu perguntava, "vocês acham importante celebrar?" e eles respondiam, "sim"; daí eu rebatia, "então porque não o fazemos?" e eles diziam, "ah, porque brasileiro não tá nem aí pra isso." Ora, há uma contradição aí... Enquanto todos tirarmos o corpo fora, ninguém vai se beneficiar e nada vai mudar. Aí que entram o papel das lideranças, mas essa é outra história.

Em tempos de hino nacional nos estádios de futebol, que sentido faz que maioria das escolas, públicas e privadas, tenham abolido a solenidade de suas práticas? Poucas são as escolas que ainda põem seus alunos perfilados perante a bandeira, como saudosamente fazia a irmã Jesuína nos bons tempos de Helena Guerra. Uma vez por semana, a escola inteira - exceto os tampinhas. E tinha também a mãe do nosso amigo Fil, Professora Rosana, que nos ensinou os quatros hinos da pátria.

O negócio é esse: o país é maior que a corja de safados que o regem. Né?

domingo, 15 de novembro de 2009

O legado polêmico de Allan Poe

 
Oh! Lenore...
Este ano comemora-se o bicentenário de nascimento do escritor norte-americano que os franceses adoraram - sem entender! -, o bostoniano Edgar Allan Poe. Sua memória e obra estão sendo relembradas pelo mundo todo com congressos, leituras, reportagens e (provavelmente) re-edições. Dono de múltiplas facetas, Poe deixou sua marca, positiva e negativa, sempre controversa, em vários campos da literatura.

Podemos classificar Allan Poe, grosso modo, como um artesão incansável do ofício das letras, além de um intelecto privilegiado, capaz de sistematicamente abstrair e explorar os recônditos mais iluminados e escuros da mente humana. Ao mesmo tempo, porém, sua obsessão formalista e racional gera críticas quanto ao sucesso do que ele se propunha a fazer. Analisemos brevemente seus méritos e, se ele os tiver, desméritos.

Qual leitor, estudioso ou amador (por falta de melhor termo), nunca leu estórias como "O Gato Preto", "Os Assassinatos da Rua Morgue" e "O Escaravelho de Ouro"? Quem nunca gostou de terror, atmosferas góticas, paranóia e sangue? Poe está no top five dos clássicos populares devido a esse seu appeal temático. O que poucos sabem é que ele foi o inventor da estória de detetive. Sim, Poe criou o primeiro cara de hábitos esquisitos e inteligência assustadora que sai à caça de criminosos. Auguste Dupin é um parisiense pacato que num pulinho a um sebo encontra seu amigo/narrador, formando assim o modelo de dupla dinâmica indispensável em todas as séries do gênero. Dupin usa apenas seus neurônios pra desvendar os mistérios: raciocina sobre os fatos, põe-se na mente do inimigo pra saber seu próximo passo e chega às respostas. O modelo foi usado posteriormente em inúmeras duplas de detetives, como Sherlock Holmes e Hércule Poirot, só pra ficar com o mais famosos. Uma falha apontada nas Dupin stories é que ele às vezes sabe mais do que nós e assim não ficamos no mesmo terreno. Numa boa estória de detetive, leitor e herói têm de dispor das mesmas informações, pra que não sobre dúvida de que eles são bem mais fodas que nós, pobres diabos.

O pioneirismo de Poe nesse gênero de estórias é facilmente explicável por sua fascinação pelo racional, pelo lógico, pela preocupação com a construção ultra-meticulosa das tramas. Para ele, toda narrativa devia ser escrita do fim pro começo, ou seja, deve-se primeiro pensar no efeito causado pela resolução, como a surpresa etc., e daí trabalhar detalhe por detalhe pra que tudo se encaixe e culmine naquele final surpreendente. Na poesia, Poe acreditava numa espécie de reino platônico da beleza, um plano superior que o poeta tenta acessar e traduzir em poesia. O poema precisa elaborar este sentimento, fazer-se instrumento da beleza pura. Na prática, porém, nem sempre funcionava...

Um conto que ilustra as concepções poenianas com muito sucesso é o famoso "O Barril de Amontillado," amplamente aclamado pela crítica como um dos melhores. Esta trama de vingança gira em torno da frase nemo me impune lacessit, presente no brasão da família do vingador Montressor, que quer dizer "ninguém me fere impunemente." Com excelente uso de ironia dramática, o personagem acaba por fazer jus a seu mote e suas intenções, levando a cabo a vingança de modo notável e imperceptível.

Outro conto que não funciona tão bem é "O Coração Delator." O fio condutor deste é a frase "Nunca antes daquela noite eu sentira a extensão de meus próprios poderes, de minha sagacidade." O protagonista deste conto deseja matar um velho com quem divide morada porque o olho de abutre dele não para a nenhum momento de fitá-lo acusadoramente, levando este já louco vizinho à insanidade total, daí a ironia de seu comentário acima. O assassino acredita ter os sentidos super-sensíveis, o que o faz ouvir o coração do velho a todo momento. Após matar, esquartejar e esconder o corpo do velho embaixo do assoalho de seu quarto, o narrador/protagonista (na falta de um nome próprio) recebe a visita dos cops, quero dizer, dos home, quero dizer, da polícia, que ouvira gritos e vasculha a casa a procura de algo errado. O protagonista, nervoso mas pretensioso, os leva ao seu aposento e se senta em cima do cadáver, mas ali começa a ouvir o coração do morto bater, literalmente, e, enlouquecido, se entrega num ataque de paranóia. Aqui, em minha modesta opinião, a idéia dos sentidos superaguçados me pareceu exagerada e sem sustentação na trama, pois só serve para o cara ouvir algo que não acontecia de fato e acabar pirando de vez. Faz algum sentido, pois ele já era louco e no fim faz jus à proposição citada acima, mas mesmo assim é um recurso forçado, que não tem liga com o resto dos acontecimentos. Percebe-se isso ao se ler o conto, fica claro que Poe precisava de alguma coisa que ajudasse a culminar no final que tinha em mente e não conseguiu pensar em algo melhor. Enfim, não se acerta sempre. 


 Tell-tale Heart, de Henry Clarke
Apesar de muita teoria, a poesia de Poe é universalmente considerada péssima. Recentemente, um expert dos EUA afirmou num congresso em BH que, dos 50-e-poucos poemas que Poe escreveu, salvam-se uns 5. Alguns acham que nem isso. Se você gosta do famoso "O Corvo," pode continuar gostando, não tem problema, mas saiba que em inglês ele é considerado bem medíocre por seu ritmo infantilóide. Outros, como "Os Sinos," só podem ter sido concebidos em momentos de embriaguês absoluta e não com a frieza do mestre. Melhor pensar que foi.

Espero ter conseguido demonstrar como o legado de Poe é controverso. Entre outras considerações que se podem fazer hoje, uma delas é que a teoria poética poeniana é bastante ingênua, pois de certa forma implica a ultrapassada idéia que ler poesia é tentar entender o que o poeta quis dizer, já que ele expressa um vislumbre da beleza superior. Por outro lado, sua influência sobre outros escritores tem sido forte. Poe arrancou elogios de Freud e Jung, entre outros, por suas explorações da mente, e também pregava que escrever é um exercício meticuloso, ao contrário dos românticos de sua época, que passavam a idéia de que eram como profetas, porta-vozes de Deus.

Abaixo vão alguns links pra ler Poe em português. Leia, divirta-se (?) e depois tire suas próprias conclusões.


http://www.releituras.com/eapoe_coracao.asp


segunda-feira, 9 de novembro de 2009

A opulência dos trópicos e dos nórdicos - parte II

E como diria o José Simão, "Buemba! Buemba!" A crise andou bem apertada n'alguns cantos desse mundão. E na Islândia - onde mesmo? - a não toda poderosa McDonald's encerrou atividades após ver um custo operacional já exorbitante aumentar ainda mais. O pequeno país gelado correu pras lojas pra desepedir-se dos Big Macs antes das McPortas se fecharem pra sempre. McDonald's agora só quando um parente for viajar ao exterior e trouxer congelado pra casa, o que lá naquelas alturas não é nenhum desafio.

Aquele rincão inalterado de Vikings foi pelo jeito um dos estados que mais apanhou da crise, que fez um ano outro dia aí. Os bancos do país foram à bancarrota, o que, num lugar com 200 mil habitantes, deve significar que todo mundo teve de quebrar o porquinho pra pagar contas. Viraram o primo pobre da família nórdica. O dono da franquia do fast food lá afirmou que estava pagando preço de whisky por cebolas da Alemanha, tão absurda era a situação. Aí, meu amigo, é mais digno abrir uma importadora de gole, que os islandeses bebem bagaraaai.

Enquanto isso, o Brasil sai firme e orgulhoso da crise, com uns socos na barriga e uns chutes na cara, mas nada que não seja capaz de aguentar com altivez. Estamos comprando caças, vendendo mais carros do que comportamos, sediando dois eventos esportivos tamanho GG, triplicando o IPTU em Belo Horizonte, dando dinheiro pra Evo Morales e, como de costume, entregando mais milhões e milhões às mãos de políticos que não nos fazem porra nenhuma. Quem falar que o Hospital Municipal de Contagem tem estrutura comprometida, falta de pessoal e de medicamentos está caluniando. Ah! esses pessimistas da nação!

Já que os tempos são tão bons, até eu que não sou empresário vou cantar a pedra pr'aquele que for esperto o bastante pra me ler: vendam cachaça e comidinhas brasileiras pros islandeses; torresminho, mandioquinha frita, bobó de camarão, espetinho de gato, empada, tropeiro... carne-de-sol! (pegou o trocadilho?) Sempre digo, ninguém deixa de comer só porque tem uma crise de merda enchendo o saco, e quem paga caro por cebolas e cópias insossas, plastificadas e sanitizadas de hamburger vai pagar o dobro pela nossa linda variedade gas-tro-nô-mi-ca. Os branquelos vão pirar o cabeção. Vão por mim.

E de quebra, tragam umas escandinavas.

O futuro é nosso!

sábado, 7 de novembro de 2009

Shakespeare, precursor dos estudos culturais?

William Shakespeare é, por assim dizer, o segundo pilar da literatura ocidental, o primeiro sendo Homero. Pilares um tanto quanto chacoalhadiços, vale a pena mencionar, já que questiona-se até mesmo se realmente existiram. Muitos afirmam que jamais houve um Homero, pelo menos não como o autor do épico grego; se existiu, teria sido apenas o responsável por coletar as partes do mito fundador da Hélade, que na época estavam na boca do povo, e reuni-los num texto definitivo. Há quem afirme que a Ilíada e a Odisséia foram obras de mais de uma mão e que isso é visível no estilo flutuante ao longo das centenas de versos. No caso do bardo de Stratford, há duas vertentes principais: os Stratfordianos, que não duvidam que o dramaturgo tenha existido e escrito sua grandiosa obra; e os Oxfordianos, que atribuem a obra shakespeareana ao também poeta Edward de Vere, 17o conde de Oxford. Há ainda os que creem que Francis Bacon seja o gênio por trás dos versos insuperáveis de "Will da lança."

Hoje, Shakespeare movimenta uma indústria acadêmico-cultural gigantesca, que o exporta como próprio sinônimo da anglicidade, assim como os franceses exportam filmes sobre como é bom ser francês e como Paris é maravilhosa. O homem é a epítome das belas-letras: é tão doloroso para qualquer escritor viver sob sua sombra que muitos o negam veementemente, o que deve lhes dar uma sensação necessária de alívio e auto-estima. Alguém assim é um prato transbordando para o desconstrucionismo dos tempos contemporâneos, incluindo aí o feminismo, o pós-colonialismo e outros -ismos dos estudos culturais, pros quais qualquer figura autoritária, opressora e representante da sociedade patriarcal deve ser destruída.

Acontece, porém, que Shakespeare strikes back do alto de sua torre de marfim. As mesmas questões que hoje interessam aos estudiosos das humanas - em suas torres de marfim - aparecem aqui, ali e acolá em Shakespeare, e sua obra já é há muito estudada por um viés pós-colonial e feminista. Há no mínimo duas peças em que essas questões são problematizadas de forma notável, O Mercador de Veneza e A Tempestade. Ousarei falar da primeira.

Em O Mercador, um judeu agiota empresta dinheiro ao seu pior inimigo, o respeitado comerciante Antonio, pra que este ajude seu amigo (colorido) Bassanio a cortejar a bela ricaça Pórcia. Não diferente da maioria cristã da cidade, Antonio exerce seu preconceito por judeus caluniando e cospindo na cara de Shylock, cuja profissão de usura é endemoniada pela sociedade católica. Assim, o judeu vê no empréstimo a chance de vingar-se pelas injúrias que recebe. A pena caso Antonio não honre o compromisso é meio quilo de carne do seu próprio peito (!). Se você acha isso absurdo, é porque é mesmo, mas na hora Antonio não tinha a quem mais recorrer e ele chega a crer, do alto de sua condescendência, que Shylock está ficando generoso porque "não vai cobrar juros." Mas o azar de Antonio é macrométrico, pois sua fortuna perde no mar e ele se vê sem "as prata" pra livrar seu rabo do maligno judeu. Enquanto Shylock afia seu facão com alegria incontida, a já noiva do mancebo Bassanio aparece no julgamento disfarçada de jovem magistrado, sem que ninguém na praça o perceba, intercede em favor de Antonio, usando uma brecha na lei  pra incriminar Shylock, que de quebra tem sua fortuna confiscada e é forçado a converter-se católico. No fim, como em todas as comédias, tudo dá certo, acontecem três casamentos, todos vão pra cama, e não é que a notícia do naufrágio dos navios mecantes de Antonio não era só um boato?

Espero ter resumido a trama da peça bem o bastate pra poder explicar, então, como Shakespeare retrata o papel das minorias. Primeiro, uma minoria étnica e diaspórica, representada em Shylock, buscando um lugarzinho ao sol, sendo esmagada e feita propriedade do estado cristão. A filha de Shylock foge, rouba parte da grana do pai como "lição de moral" e casa-se com um cristão, entregando-se de pernas abertas à nova religião. Segundo, uma minoria de gênero representada pela sagaz Pórcia, que mostra como a mulher inteligente pode contornar o poder patriarcal da sociedade subvertendo o gênero através das aparências. Ela não só salva Antonio como também entrega a grana do judeu de bandeja para a cidade. Em outras palavras, ela guarda todos os marmanjos no bolso ao mostrar que entende a lei deles melhor que eles mesmos. Ao final, na trama paralela dos anéis, Pórcia dá outra nos homens provando que são elas quem têm total controle sobre eles e os assuntos da casa, da família e da vida amorosa. Ou seja, quem decide se o cara vai ou não ser um corno são elas.

A preocupação polítca tão contemporânea na obra de Shakespeare não é coincidência ou fruto de seu gênio. Afinal de contas, algumas dessas questões eram da ordem do dia no fim do séc. XVI, quando os países europeus buscavam firmar-se como nações, a igreja católica buscava manter seu poder na Europa e expandi-lo ao Novo Mundo e Ásia, e os judeus eram encurralados e forçados a converter-se, nem que a força do pau-de-arara. A questão feminista, essa eu não sei a quantas ia 500 anos atrás, imagino que ainda nem engatinhava. Mas pras mulheres o sentimento sempre deve ter existido

De prato cheio pra se descer a lenha, Will vira prato cheio se nadar de braçada. É isso que faz dele mais do que leitura obrigatória nas aulas de Elementary School ou no repertório dos escritores? Talvez, mas o que importa é comparar o que obras como O Mercador e outras exibem em comum com as atuais, assim como a reação das audiências elizabethanas com a nossa diante do bufão cômico Shylock. Duvido que hoje alguém não se compadeça com a miséria desse judeu, mas o espectador daqueles tempos o teria visto como o próprio diabo, um estereótipo exagerado de sujeito mal e ganancioso, que prefere o dinheiro à filha. Shakespeare parece se aproveitar dessa visão raza para por na boca de Shylock as falas mais eloquentes e tocantes da peça. Qual deve ter sido a surpresa geral no Globe Theatre ao ouvirem raciocínios tão afiados em versos da mais elevada beleza! Bloody Jew!

Aí está, pra mim, por que ler Shakespeare.

segunda-feira, 2 de novembro de 2009

Ser brasileiro é o que há

As vantagens de ser brasileiro! Leia esse artigo interessante que encontrei no excelente PapodeHomem.com.br.

http://papodehomem.com.br/sou-brasileiro-com-muito-orgulho/

Trata-se apenas de uma visão pessoal e nada mais especial do que a minha ou a sua, mas ainda assim interessante pelo fato do autor ser um cara com o privilégio de conviver com gringos e viajar pro exterior de vez em quando.

E, de quebra, explore o resto do site para informações ainda mais interessantes.